O Brasil está diante do maior escândalo de manipulação de resultados esportivos para beneficiar apostadores corruptos. Já são 11 partidas sob investigação policial, com atletas indiciados criminalmente e a certeza de que foram realizados lances em jogos que vão contra o princípio da lisura esportiva para beneficiar uma quadrilha de bandidos.
O que mais impressiona em todo o escândalo não é o esquema das apostas em si. Isso não é novidade alguma para quem trabalha na indústria do esporte. Desde os anos 1980, existe o problema de atletas corrompidos para atuarem em favor de bandidos-apostadores. Tanto que, atualmente, existem diversas empresas especializadas em monitorar estatísticas em tempo real, tanto dos eventos esportivos quanto das casas de apostas.
O que de fato surpreende é o silêncio vergonhoso tanto da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) quanto do governo federal sobre os casos. Já são 11 partidas com mudança esportiva provocada por atletas corrompidos. E nada, absolutamente nada, de punição aos infratores. Pior ainda é saber que, até agora, recebemos desses órgãos (in)competentes apenas notas oficiais em que dizem tudo, mas que não têm absolutamente nada de concreto.
O Brasil está, desde janeiro de 2018, deitado em berço esplêndido na questão da regulamentação do funcionamento das casas de apostas no país. Já passou um mandato presidencial inteiro e nada foi feito.
Caminhamos, agora, para o quinto mês do ano. A promessa do governo atual é de que, até o final do mês, tenhamos a Medida Provisória para regulamentar as apostas. E, depois, o caso irá ao Congresso e ao Senado para virar lei.
Mas, enquanto isso, as apostas rolam soltas. E estão ao Deus dará. Sabe aquele desabafo do Galvão Bueno após o quinto gol da Alemanha? “Ninguém sabe o que faz, ninguém sabe para onde vai, ninguém sabe onde pula, ninguém sabe pra onde olha”…
É assim que está o segmento de apostas no Brasil. Há três anos temos, na Máquina do Esporte, feito um mapeamento do mercado. Atualmente, nas quatro principais divisões do futebol brasileiro, tem time que atua com três marcas diferentes de casas de apostas na camisa. Na Série A, as placas de publicidade estática contam com três a quatro apostas diferentes.
Enquanto isso, na Inglaterra, um dos mercados mais desenvolvidos do mundo, o governo acaba de proibir o patrocínio das apostas na parte principal da camisa. É mais um movimento para tentar frear a atuação sem limites das casas, que hoje ameaçam representar um problema de saúde para o povo britânico, graças ao vício nos jogos.
No Brasil, estamos sem qualquer limite. E isso fica claro quando vemos um escândalo de manipulação manchar a reputação do mercado, e CBF e governo não mostrarem qualquer preocupação com isso.
Enquanto não levarmos a sério o mercado de apostas, continuaremos a drenar pelo ralo um segmento importante da indústria. Como acontece em quase tudo por aqui, temos deixado o barco seguir à deriva. O estrago, porém, poderá ser muito maior do que apenas zagueiros comprados para cometer faltas, receber cartões amarelos ou algo do gênero.
CBF e governo precisam entender que eles têm uma culpa enorme nessa história. Tanto quanto os jogadores que aceitam serem corrompidos.
Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte, além de consultor, professor e palestrante sobre marketing esportivo